domingo, 30 de novembro de 2008

Toponímia de Cavenca

Temos por hábito não questionar os nomes através dos quais relacionámos tudo que nos rodeia porque nos acostumámos desde muito cedo a ouvi-los, escrevê-los e relacioná-los com pessoas, com lugares, com coisas. E se de algum modo nos ocorre tentar saber o porquê logo desistimos porque assim é que está bem e dificilmente conseguiríamos arranjar alternativa melhor.
Cavenca, a minha aldeia natal, detém uma toponímia pouco comum cuja origem é desconhecida, penso eu, de todos os “cavenquenses” e da generalidade das pessoas, precisamente porque os nativos se conformam com o nome e os outros não estão para se incomodar com isso. Porém, a minha curiosidade levou-me a efectuar algumas pesquisas e o resultado é o seguinte:
... O resto é por aqui.

sábado, 29 de novembro de 2008

Ventos de Espanha

"Um filho não nasce; forma-se. E para isso é preciso tempo, dedicação, apego, carinho, amor, segurança, responsabilidade. É preciso ser adulto, saber dizer “não”, levá-los aos hospitais para verem crianças doentes, ensiná-los a respeitar a natureza. Com estas componentes, é seguro que o filho será um bom filho. Se um pai educar bem o filho, corre o risco de aos 14 anos ele fazer uma coisa mal feita, como experimentar droga. Se o pai não dá conta em dois meses ele perde-se. Mas se dá conta, esse comportamento – ou outro - será um delito que só acontecerá uma vez".
O artigo do JN de hoje despertou-me a atenção e não resisti a trazê-lo para aqui, não só para demonstrar que os "ventos de Espanha" nem sempre são tão maus como se diz na gíria, mas também para convidar a uma reflexão sobre a educação dos nossos filhos e o papel dos pais em todo esse processo. "O que calam os nossos filhos?" é o título de um livro que vai ser lançado brevemente em Portugal e parece que já é um caso de sucesso do outro lado da raia. Pela amostra que aqui vem estou seguro que também o será deste lado.
Estou certo também que muitos dos problemas sociais num dado momento radicam na forma como se formaram os homens e mulheres desse tempo. As famílias, umas desestruturadas, outras "sem tempo" para dedicar ao problema da educação dos filhos, procuraram transferir a responsabilidade que cabe aos pais para as escolas. As escolas são incapazes de, por si sós, corresponder àquilo que é necessário para formar uma pessoa. Acontece que em muitos casos a deformação e a degradação dos valores atingiu clamorosamente estes dois pilares da educação e o resultado é o que se vê: não se pode dar aquilo que não se tem...

terça-feira, 25 de novembro de 2008

O Vice Rei

A densa nebulosidade que envolve o 25 de Novembro de 1975 é agora ligeiramente agitada pelo livro do Brigadeiro Pires Veloso, o "Vice Rei do Norte", um livro que parece trazer alguma luz sobre o que realmente se terá passado. E ficamos a saber que o herói que viria a ser idolatrado e recompensado com dois mandatos na presidência da república nada fez para merecer ser tão laureado. Muito mais ainda haverá para aclarar mas é preciso que os intervenientes se pronunciem, que tenham a coragem de dizer o que sabem, porque morreram dois jovens "comandos" na Calçada da Ajuda, porque Jaime Neves foi proscrito... ou quase, porque dissolveram o Regimento de Comandos, que acertos de contas foram esses.
Mas desse tempo e daí em diante muitas mais coisas há para esclarecer. Só que parece não ser conveniente.

25 de Novembro

Decorreram 33 anos, a idade com que morreu Jesus Cristo, segundo a Bíblia. Ainda hoje não sei o que aconteceu nessa data histórica. Penso, contudo, que não se pode dissociar do célebre "documento dos nove", surgido em Agosto do mesmo ano.
No dizer de Vasco Gonçalves, "o documento tinha (...) um objectivo fundamental: pôr fim ao processo revolucionário, às transformações económicas, sociais e políticas a caminho do socialismo. É centrado, na melhor das hipóteses, num conceito de terceira via para Portugal e exprime um pensamento de esquerda da pequena e média burguesia, bem como os seus receios em relação à ascensão da classe operária, em geral, e do Partido Comunista, em particular".
Nesta altura, integrava eu as forças armadas e encontrava-me a prestar uma comissão de serviço em Angola. Reunidos num anfiteatro ao ar livre, votamos o documento de braço no ar, quais ceguinhos do novel filme baseado na obra de Saramago, isto é, não votamos, porque o que queríamos era mesmo vir embora e se o subscrevêssemos arriscávamo-nos a ficar lá os dois anos que a comissão implicava, disse-nos o Tenente Coronel que comandava aquela tropa toda.
A verdade é que a partir dali a situação política alterou-se gradualmente até que com a "sarrafusca" de 25/11 a bandalheira e o caos instalados nas Forças Armadas acabaram.
Penso eu...

sábado, 22 de novembro de 2008

Ensaio Sobre a Cegueira

Crítica:
A crítica internacional não foi generosa com "Ensaio sobre a Cegueira", filme de Fernando Meirelles que abriu o Festival de Cannes nesta quarta-feira.

Ensaio Sobre a Cegueira é uma das mais fiéis e merecidas adaptações da literatura para o cinema.

A minha opinião:
Vi e gostei. Um pouco forte. Como se pode ver, muito mudou desde que o filme foi apresentado em Cannes e a obra final em exibição nos cinemas. No entanto, a Federação Nacional norte-americana considerou que o filme apresenta deficientes visuais como monstros e sugeriu mesmo que fosse retirado. Saramago respondeu à sua maneira: "a estupidez não escolhe entre cegos e não-cegos".
Embora classificado para maiores de 16 anos, ao meu lado encontrava-se um casal com uma menina de dez, aparentemente. Não me pareceu sensato nem apropriado mas...

Imagem: http://www.adorocinema.com/filmes/ensaio-sobre-a-cegueira/ensaio-sobre-a-cegueira-poster09.jpg

Pacificação...

"... o primeiro-ministro disse que as «profundas mudanças» a imprimir nas Forças Armadas «são incompatíveis com velhos hábitos e velhos modelos» e com «complacência com conservadorismo e o imobilismo» ".

Depois do GRITO de alerta do General Loureiro dos Santos e das tímidas abordagens do Ministro da Defesa ao tão propalado mal estar no seio das Forças Armadas, foi a vez do nosso primeiro deitar água na fervura brindando as cúpulas militares presentes na sala de visitas do IESM, na cerimónia inaugural do ano lectivo, com os "mimos" que ali estão plasmados.
E ficaram todos felizes...

sexta-feira, 21 de novembro de 2008

Medos

A Direita endeusou, a Esquerda simbolizou o Deus do bem e do mal, mas o político tem apenas de ser reduzido à sua condição humana. A maior parte dos nossos políticos, jovens, dinâmicos e pós-modernos ainda não repararam que estão todos no século XIX e não no XXI. Enquanto isto, o grosso das pessoas recusa pensar, sonhar e agarrasse à sua existência como se não houvesse vida paralela. Há medo, nunca vi tanto medo no meu país.
Mesmo com aquela "gralha" ali destacada a amarelo, este extracto da entrevista que Fernando Dacosta concedeu ao JN obriga-nos a pensar. Eu sou obrigado a concordar porque temo pelo porvir dos nossos filhos. Muitas das opiniões pessoais que por aqui vou plasmando prendem-se, precisamente, com esses "medos" que nos inibem, intimidam e obrigam a aceitar resignadamente o descalabro e o desmoronar de um período de esperança e de deslumbramento mas eivado de enganoso progresso.
Como Fernando Dacosta bem refere, a nós, os que tivemos o "privilégio" de viver o "compacto de experiências" que a segunda metade do Século XX nos proporcionou, compete-nos sensibilizar os mais jovens e fazê-los sonhar.
Mas como?

quinta-feira, 20 de novembro de 2008

A Dança das Bruxas

Não era nenhum Adónis mas tinha um cortiço robusto e escarmentado nas lides da vida. Era respeitado e respeitador, conhecido em todo o Alto Minho e até por terras de Barroso aonde se deslocava de tempos a tempos em negócios ou apenas para observar o que de melhor por lá se criava.

Texto integral aqui.

terça-feira, 18 de novembro de 2008

A Cultura do Linho

Gostei de ver a evocação que fez o meu amigo Eduardo Daniel Cerqueira, do blogue Paredes de Coura - Terra com Alma , à tradicional cultura do linho. Trata-se de uma amostra das tradicionais "fiada" e "espadelada" onde não faltam os cantares regionais, os namoricos, as rixas, a merenda.
Mas acerca desta ancestral actividade muita coisa se pode dizer ainda porque o ciclo do linho nunca tinha fim. E eu, recorrendo ao arquivo das minhas memórias de infância, posso deixar alguns contributos para ilustrar o quão árdua era essa tarefa.
Continua aqui.

segunda-feira, 17 de novembro de 2008

Curiosidades

Acaba de ser revelado em Angola que no Kwanza Norte, durante o censo eleitoral foram registados 156.666 eleitores e por incrível que pareça todos os eleitores inscritos (156.666) votaram. Nem mais 1, nem menos 1.
De "passagem" por Moçambique deparei-me com esta curiosidade, ou nem por isso. A consciência cívica do povo angolano está bem espelhada ali, no Kwanza Norte, e até apostava que votaram todos no partido do governo. Como é bom viver em democracia!!!!

domingo, 16 de novembro de 2008

Monção em Imagens V

Hoje entramos pela Porta do Rosal. Muito mais simples do que a Porta de Salvaterra, esta abre-se na muralha entre o baluarte da Senhora da Guia e o de Terra Nova, de arco pleno, longa abóbada ladeada por fresteiras, e dupla porta. Interiormente tem contrafortes, entradas para casamata e 2 túneis de acesso à falsa braga; exteriormente é encimada por guarita.

Um plano que permite observar melhor as frestas que ladeiam o túnel que atravessa a muralha. Mais à frente, pelo lado interior, existem duas portas laterais que dão acesso às casamatas. Talvez seja um espaço que serviu de aposentos para a guarnição militar ou para prisão.

O mesmo túnel visto da porta interior.

Já no interior situa-se o Paiol, todo coberto em granito.

Placa com informação sobre o Paiol.
Uma panorâmina sobre o Paiol e Largo do Paiol. Ao fundo vê-se a nova estrutura cultural de Monção, que cresceu no espaço onde se situava o Cine-Teatr0.

sábado, 15 de novembro de 2008

Carta para Josefa, minha avó

Tens noventa anos. És velha, dolorida. Dizes-me que foste a mais bela rapariga do teu tempo – e eu acredito. Não sabes ler. Tens as mãos grossas e deformadas, os pés encortiçados. Carregaste à cabeça toneladas de restolho e lenha, albufeiras de água. Viste nascer o sol todos os dias. De todo o pão que amassaste se faria um banquete universal. Criaste pessoas e gado, meteste os bácoros na tua própria cama quando o frio ameaçava gelá-los. Contaste-me histórias de aparições e lobisomens, velhas questões de família, um crime de morte. Trave da tua casa, lume da tua lareira – sete vezes engravidaste, sete vezes deste à luz.
O texto completo pode ser lido aqui.

Não me canso de ler esta carta que José Saramago dedicou à sua avó. Vejo neste retrato a figura de muitas avós, mães, irmãs. E como bem refere Saramago, a culpa não foi delas. E que bem eu o compreendo...
Foi este texto que me fez descobrir a obra literária do autor e arredar a ideia feita de opiniões alheias de que era um escritor "intragável".

quinta-feira, 13 de novembro de 2008

Respect


Actualização (em 14Nov08)
Fui alertado pelo comentário a este post que havia um lapso de tempo demasiado longo sem qualquer som. Confesso que, de entre as várias hipóteses que encontrei no YouTube, me pareceu a mais bem conseguida, até pela repetição que apresentava mas que não ouvi até ao final. Por isso decidi substituir o vídeo e aproveito para esclarecer que a razão da minha escolha foi ter lido no diário (gratuito) "Metro" que a intérprete foi eleita "a maior cantora de todos os tempos" num inquérito levado a efeito pela revista de música norte-americana "Rolling Stone", num universo de 179 músicos, produtores, editores e outras figuras da indústria musical.
Este reconhecimento tem a importância que tem mas o valor da artista é inegável.

Recessão?

O Governador do Banco de Portugal disse que ainda não está confirmada uma recessão na Europa e que é uma apreciação “enganadora” pensar que o BCE falhou na estabilidade dos preços.
Está dito. Já podemos ficar mais tranquilos. As irregularidades no BCP nunca existiram, o saque do BPN foi uma cabala, os analistas de economia que hoje proclamaram oficialmente que a Alemanha está em recessão e a Espanha vai pelo mesmo caminho são uns mentirosos.
É para isto que lhe pagam num ano a remuneração correspondente ao salário anual bruto de cerca de 50 trabalhadores(*)?

*€425,00 x 14 meses
Os rendimentos do trabalho dependente de Vítor Constâncio totalizaram os 280 889,91 euros em 2005.

Não Vote em Branco

Um funcionário da EPUL está a ser alvo de processo disciplinar com intenção de despedimento depois de ter reenviado para os colegas um e-mail humorístico com uma foto de campanha de Barack Obama com a mensagem «não vote em branco».
As relações hierarquico-funcionais nem sempre são entendidas num contexto de cooperação e empenho com vista a um objectivo previamente estabelecido. Por vezes geram-se conflitos que é imperioso dirimir com recurso a mecanismos coercivos. Outras vezes usa-se e abusa-se dos meios coercivos para resolver aquilo que o bom senso e a criteriosa gestão dos recursos não conseguem.
"Almeida Faria faz parte de um grupo de quatro quadros dirigentes da EPUL apeados dos seus lugares no início do ano, por decisão da administração, e cujos salários foram reduzidos. Três deles apresentaram queixa contra a empresa, quer nos tribunais, quer na Autoridade para as Condições de Trabalho, a que juntaram um parecer jurídico encomendado pela empresa há alguns anos a um especialista em direito administrativo, por ele defender a sua posição. Além de acusar Almeida Faria de ter violado o regulamento de utilização dos meios informáticos da EPUL ao reencaminhar a mensagem sobre Obama, a administração considera que ele lesou a empresa por, na queixa judicial referida, ter usado o parecer jurídico sem o seu consentimento. Uma acusação que se estende aos dois outros quadros dirigentes destituídos, contra os quais foram também, por idêntica razão, levantados processos disciplinares" refere o Público.
Mesmo concedendo que os meios informáticos não devem servir para fins diferentes dos prosseguidos pela empresa parece-me que andam ali "mosquitos por cordas"!

terça-feira, 11 de novembro de 2008

A Roda

Peço desculpa aos meus leitores pela inserção, ali em baixo, de uma imagem um pouco descontextualizada, a não ser para servir de separador entre o tema do post e os meus comentários finais. Houve contudo uma intenção: deixar o pretexto para uma explanação "técnica" acerca da famosa roda do carro de bois. Peço também desde já desculpa pela omissão do autor mas a verdade é que já não sei de onde a "roubei"...
Este exemplar, bastante danificado pelo uso e, certamente, pelo tempo de vida, é perfeito para explicar como se faziam os rodados dos carros de bois da minha terra.
A madeira utilizada era o carvalho, por ser mais resistente. Escolhiam-se, para o efeito, árvores de bom porte e, regra geral, centenárias, das quais se aproveitava apenas o cerne, porque a camada exterior é extremamente frágil, em absoluto contraste com o miolo.
As duas rodas, ligadas por um eixo rígido feito de madeira mais macia por causa do atrito a que era sujeito sob os calcões e ao aperto dos apeladoiros, eram colocadas de forma que quando um minle ficasse na horizontal o outro ficasse na vertical, conferindo mais resistência ao rodado.
As guarnições exteriores de ferro eram fortemente pregadas à madeira com garrotes, uns pregos enormes de fabrico artesanal.
Quando a madeira era boa e os cuidados de manutenção não faleciam as rodas eram capazes de servir várias gerações.
Hoje deu-me para isto...

segunda-feira, 10 de novembro de 2008

O Tesouro Encantado (XV)

A grande dificuldade é que o dia aproximava-se do seu fim e o local não era propício para ali estabelecer arraiais. A agravar a situação chegou a notícia, através de um estafado mensageiro, que as autoridades sanitárias e judiciais só podiam deslocar-se no dia seguinte e apenas a Cavenca pelo que o Cabo da Guarda devia promover a remoção do cadáver para o povoado com todas as cautelas para não prejudicar os exames forenses.
Era o mal menor. Pelo menos não iam ter de pernoitar naquele lugar já de si medonho, tanto mais na companhia de um morto em circunstâncias que pareciam ser obra do demónio e não faltou quem voluntariamente se oferecesse para efectuar o transporte. Com apropriados paus e lençóis que alguns familiares providencialmente tinham levado, foi o corpo carregado com todo o cuidado para uma improvisada maca e dali para a capela de Cavenca, que não havia local mais apropriado para colocar o defunto.
No dia seguinte chegaram umas pessoas importantes. Foram recebidas pelo Cabo da Guarda que mais uma vez fora obrigado a aboletar-se em casa do João Sapateiro e de imediato dirigiram-se à Capela. Havia alguns curiosos no exterior mas lá dentro ninguém foi capaz de permanecer por causa do pestilento odor. Também tal não fora permitido pelo zeloso agente da lei porque era forçoso garantir a inviolabilidade do putrefacto canastro do Zé da Bina.
Enquanto o Delegado do Ministério Público tomava apontamentos o médico legista deu início às operações para analisar pormenorizadamente o cadáver. Com a ajuda do seu auxiliar começou a recortar as diversas peças de vestuário perfeitamente intactas e, para espanto de todos, não encontrou sequelas que indiciassem causas prováveis da morte. Apenas ao voltar o cadáver para examinar a região dorsal do finado se tornaram visíveis cinco perfurações profundas, uma à direita e as outras quatro ao longo da grelha costal à esquerda, como se uma imensa mão, munida de longas e aceradas garras, o tivesse agarrado e arrebatado pelos ares, depositando-o no misterioso e recôndito local onde foi encontrado.
O caso foi encerrado ali mesmo. Do relatório da autópsia ficou a constar que o óbito ocorreu por causas desconhecidas.
O livro foi arrestado pelas autoridades e, ao que consta, o tesouro ainda hoje permanece nas profundezas da Fonte do Seixo à espera que alguém consiga quebrar o encantamento e resgatá-lo da maldição com que o discípulo de Mafoma o protegeu.


Chega assim ao fim a minha mais longa incursão pelo Conto. Não se tratará, certamente, de obra literária de vulto mas deu-me um gozo extraordinário escrevê-lo. Foi bom mergulhar nos tempos em que os serões eram preenchidos com narrativas do mesmo género e que nos faziam sonhar fantásticos seres forjados na nossa imaginação.
Os cenários são bem conhecidos das minhas gentes mas quero aqui deixar bem claro que qualquer semelhança com pessoas ou locais é mera coincidência.
Aqui pode ser lido o texto integral.

quinta-feira, 6 de novembro de 2008

É Triste...

Seis portugueses morreram e um sétimo ficou gravemente ferido na sequência de um choque entre um camião e uma carrinha, ambos de matrícula portuguesa na zona de Torquemada (Espanha).
É uma verdadeira tragédia a que ocorre com frequência nas estradas espanholas. Não sei quantas vidas já foram ceifadas em circunstâncias semelhantes mas foram muitas, principalmente nos últimos anos. E o que mais me revolta é que, em geral, a razão é só uma: a busca de condições de vida mais digna do que a que lhes é propiciada na sua Pátria.
São todos activos trabalhadores, gente que cria riqueza noutras terras, que se esfalfam semana a semana por essas estradas fora numa correria contra o tempo para que não falte o essencial à mulher e aos filhos.
"Ditosa Pátria que tais filhos tem", disse Camões, num arrebatamento de louvor ao génio lusitano. Se fosse hoje talvez tivesse mais razões para escrever maldita mãe que assim trata os seus filhos. Só que a mãe não tem culpa...
Triste sina a nossa!

terça-feira, 4 de novembro de 2008

Do Rio Tua ao Rio Pinhão - O Último Olhar

Estava sentado no lugar do condutor, numa posição perfeitamente correcta, as mãos sobre as coxas e a cabeça um pouco inclinada para trás. Se não fosse a cadavérica lividez do rosto e os olhos abertos dir-se-ia que estava a dormir. Mas não. Estava morto.
No banco ao lado estava um saco de papel vazio e sobre o abdómen uma pistola da calibre 7,65. Uma perfuração na têmpora do lado direito e o sangue que jorrara abundantemente da ferida denunciavam a forma como terminara a vida daquele jovem, no meio de um pinhal algures na serra entre Fundões e Souto de Escarão. Ninguém o conhecia.

A narrativa completa encontra-se aqui.

segunda-feira, 3 de novembro de 2008

O Tesouro Encantado (XIV)

Na sua residência oficial, o Cabo da Guarda tinha acabado de almoçar, a segunda refeição do dia que então se designava por jantar, e cochilava pachorrentamente à mesa quando alguém bateu à porta com vigor. Algo contrariado acorreu à porta para saber do que se tratava. Era o Plantão que tinha acabado de receber um telefonema do regedor de Riba de Mouro. Na serra, por cima de Cavenca, aparecera o cadáver de um homem, supostamente o jovem que tinha desaparecido misteriosamente uma semana atrás.
Estava um calor dos diabos mas não havia tempo a perder. Ataviou-se num instante e desceu as escadas para o seu gabinete, no rés do chão da moradia que também servia de Posto. Tentou contactar a autoridade judiciária mas ninguém atendeu do Tribunal. Àquela hora era certo que estava fechado para almoço. Mas não podia perder tempo sob pena de ter de pernoitar na serra até ao dia seguinte. Deixou instruções claras para que logo que fosse possível fosse informado o Delegado do Ministério Público do sucedido e acompanhado de um soldado que estava no Posto à ordem pôs-se em marcha com destino à maldita Fraga.
A jornada era longa e dura. Sabia-o por experiência própria. E tiveram sorte. Mal tinham iniciado a caminhada apanharam uma boleia numa camioneta de mercadorias que os transportou até à Igreja de Riba de Mouro, mas dali não passava. A estrada ficava mesmo por ali. Tiveram de meter os pés a caminho o que não era tarefa fácil.
Entretanto o Amadeu, conhecedor das enormes dificuldades de acesso à Torre dos Ferreiros, não ficou parado. Sabia que o esperava uma longa jornada e, fazendo alarde de toda a sua perícia para se deslocar naquelas condições, conseguiu contornar o penhasco e, protegendo o irreconhecível corpo com uns arbustos, foi esperar as autoridades para um local mais conhecido.
Eram quase cinco horas da tarde quando os agentes da autoridade chegaram, extenuados, ao Arroio onde o Amadeu os esperava. Seguiram por um estreito carreiro por cima dos campos de feno, atravessaram a encosta do Outeiro Lagarto até próximo da Corga da Calhe, depois uma escalada a corta mato até ao sopé do rochedo onde se encontrava o cadáver e mais algumas pessoas, entre os quais o pai do Zé da Bina, que se aprestaram para ir reconhecer o morto e ajudar à sua remoção a fim de lhe propiciar um enterrado digno e cristão.
Foi o mesmo Amadeu, homem de compleição robusta e experimentado nos horrores da guerra civil de Espanha, que retirou os arbustos de cima do defunto. Não era um cenário fácil de presenciar. Exalava um cheiro fétido e um enxame de moscas pairava sobre o finado. Não fosse o adiantado estado de decomposição e até parecia que tinha ali ficado a dormir. Estava de bruços sobre um fofo tapete de ervas, musgo e outra matéria orgânica que cobria o solo rochoso, a cabeça um pouco de lado sobre o braço esquerdo e com o braço direito debaixo do tronco segurando ainda, como uma tenaz, um livro velho e roto. Os malditos corvos já tinham profanado o cadáver nas zonas expostas mas em tudo o resto estava intacto, sem sinais de fracturas, nem de escoriações, nem de golpes, nem sujidade nas roupas ou no calçado.
Não havia dúvidas que se tratava mesmo do jovem desaparecido na fatídica noite mas o que parecia ter sido um acidente na fuga desesperada assumia agora contornos de grande mistério.

domingo, 2 de novembro de 2008

Os Aduladores da Gravata

O insucesso no condado
Afonso Henriques, o primeiro régulo deste nosso condado, por birra, por avidez, zangou-se com o avô e com a mãe e quis governar ele este povoléu tacanho e adverso ao belle esprit. Como o Minho é pequeno até para os que cá vivem, quanto mais para os que vêm, atirou-se para sul a conquistar as terras da mourama. Espetou a lança em Lisboa e disse: «Aqui agora mando eu!». E esta frase foi passando de boca em boca pelos seus sucessores até agora. E parece que ainda é uso dizê-la...


O resto pode ser lido aqui.
Escrito em 1993 por José Leon Machado, este texto, mau grado os "enormes" sucessos verificados ao longo do actual consulado, principalmente no último ano, parece-me muito actual.
Pena que estes ecos não cheguem à capital...



José Leon Machado nasceu em Braga no dia 25 de Novembro de 1965. Estudou na Escola Secundária Sá de Miranda e licenciou-se em Humanidades pela Faculdade de Filosofia de Braga. Frequentou o mestrado na Universidade do Minho, tendo-o concluído com uma dissertação sobre literatura comparada. Actualmente, é Professor Auxiliar do Departamento de Letras da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, onde se doutorou em Linguística Portuguesa. (...) a sua escrita é simples e concisa, afastando-se em larga medida da escrita de grande parte dos autores portugueses actuais, que considera (...) «na sua maioria ou barrocamente ilegíveis com um público constituído por meia dúzia de iluminados, ou bacocamente amorfos com um público mal formado por um analfabetismo de séculos.»
http://alfarrabio.di.uminho.pt/vercial/leon.htm

As Velhas são o Diabo...

Ninguém case com mulher velha. As velhas, ainda que pareçam santas, são o demónio. Que o diga o Frederico. Tinha feito casa e perdeu-a por via da mulher, mais velha do que ele trinta anos.


O resto está aqui.


João Maria de Araújo Correia (1899-1985) nasceu em Canelas do Douro e faleceu em Peso da Régua. Formou-se em Medicina pela Universidade do Porto, tendo exercido como médico nas aldeias do Douro. Notabilizou-se como contista, sendo justamente considerado o maior contista português.
http://alfarrabio.di.uminho.pt/vercial/jcorreia.htm

sábado, 1 de novembro de 2008

Todos os Santos


Deixá-la ir, a ave, a quem roubaram

Ninho e filhos e tudo, sem piedade...

Que a leve o ar sem fim da soledade

Onde as asas partidas a levaram...


Deixá-la ir, a vela que arrojaram

Os tufões pelo mar, na escuridade,

Quando a noite surgiu da imensidade,

Quando os ventos do Sul se levantaram...


Deixá-la ir, a alma lastimosa,

Que perdeu fé e paz e confiança,

À morte queda, à morte silenciosa...


Deixá-la ir, a nota desprendida

Dum canto extremo... e a última esperança...

E a vida... e o amor... deixá-la ir, a vida!


Antero de Quental