sexta-feira, 31 de julho de 2009

Brandas ou Verandas?

Não abundam as referências aos pequenos aglomerados de casas que salpicam as montanhas da serra da Peneda. A fazer fé no dicionário Priberam, Branda é um nome utilizado no Minho para designar uma tapada ou pastagem nas montanhas. É alguma coisa mas muito pouco para descrever a importância das brandas na economia rural do Alto Minho e numa economia mais globalizada que é o turismo rural na actualidade.
O saudoso Padre Bernardo* foi um acérrimo defensor da Veranda. E justifica: "A palavra correcta é veranda, de verão, e bem o justifica o fenómeno etnológico de Castro Laboreiro onde a maioria do povo tem duas povoações, a saber, a veranda onde passa o verão e a maior parte do ano e a inverneira onde passa o inverno" .
Então porquê o uso tão comum de Branda? O mesmo Padre Bernardo explica: "A pronuncia estropiada de branda em vez de veranda compreende-se. Cá na região o povo substitui facilmente a letra v pelo b e diz binho, baca, cabalo, bista, o que explica a troca de pronúncia da primeira letra de veranda. A segunda letra da palavra, um «e» mudo antes de «r», esvai-se facilmente antes da pronúncia como em palavras semelhantes, ao menois cá no região onde o povo diz: esp'rança, pref'rência, ref'rência ..."
Pessoalmente inclino-me para Branda, que me desculpe o eminente teólogo, porque é assim que a minha gente pronuncia, porque é mais fácil, soa muito bem e assenta perfeitamente na paz de espírito, na brandura do clima e no sossego que ali se vive.
Para quem não souber, as brandas são (eram) pequenos aglomerados de casas simples, em geral com uma só divisão, quatro paredes e um tecto de telha vã, sem outro conforto que não fosse uma lareira para cozinhar e um cama, um catre de madeira com um enxergão de tomentos cheio de palha de centeio, eventualmente uma arca para guardar as provisões.
Em torno das casas ficam os campos de feno e as "tapadas", pequenas propriedades cercadas com muros de pedras soltas onde se recolhiam os animais para pastar e pernoitar, embora o maior manancial de pastagens venha dos extensos baldios que se alongam pela serra. Regra geral, em todas as brandas existe uma capela dedicada a um santo ou santa.
O acesso a esses lugarejos era feito a pé ou em carros de bois e apenas eram habitados pelos "brandeiros" após as sementeiras de Maio, regressando em Setembro para fazer as colheitas e também porque o aproximar do Inverno tornava a vida ali impossível.
Como bem escreveu Miguel Torga, "preparava a casa de inverno para quando chegasse a hora da transumância e toda a família —pais, irmãos, gados, pulgas e percevejos— descesse dos cortelhos da montanha para os cortelhos do vale, abrigados das neves".
A maior e talvez a única concentração de Brandas situa-se na Serra da Peneda, na confluência dos concelhos de Melgaço, Monção e Arcos de Valdevez, sendo as mais conhecidas a de S. Bento do Cando, a de Aveleira e a minha preferida, Santo António de Val de Poldros.
Outras existem, ou existiram, mas que vão perdendo significado porque vão sendo abandonadas: o meu Outeiro, Covelo, Mourim, Bouça dos Homens, Furado, Junqueira, Gorbelas, Bordença... e a Peneda, que foi branda mas o culto da Senhora das Neves transformou no maior centro mariano de peregrinação do Alto Minho.
Nesta época do ano aqueles lugarejos fervilham de vida, porque ali está-se de bem com Deus e com a Natureza.
E só agora fiquei a saber, através de uma telenovela realizada em Arcos de Valdevez por um conhecido canal privado de televisão, que os lobos são terríveis predadores de galinhas!!!

*PINTOR, Padre Manuel António Bernardo, Obra Histórica, Monção, 2005

9 comentários:

Ivy disse...

Olá amigo... O que aprendo contigo! És um poço de saber! E diga-me, parece que em todos os lugarejos( daí e daqui) havia sempre um Padre Bernardo.Porque ao menos no meu lugarejo também existiu um, muito sábio! Bom, de todo forma, aproveitei para roubar-te o Priberam. Obrigada, sim?

Beijinhos

Ivy disse...

Ah, desculpa! Esqueci de dizer: gostei tanto desta postagem que criei o link Favoritos no meu blog e o levei pra lá...Te importas? Se não quiseres é so me avisar que retiro,ok?

Beijinhos

Paulo J. Mendes disse...

Considero a telenovela em questão um insulto à inteligência e sobretudo às pessoas dos Arcos que são ali apresentadas como supersticiosas, beatas, quezilentas, ignorantes, coscuvilheiras, etc.
O único retrato verdadeiro ali apresentado é o da maneira como a "província" ainda é vista através de certos olhos - felizmente não todos - da "capital do reino".

Anónimo disse...

Boas,

Lobos como pilha galinhas. Diabo.

Para refelectir:

A citação de Torga refere-se aos brandeiros?

brandura do clima ???

A def. de branda ou veranda proposta não é um pouco redutora?

Será branda ou beranda?

Um amigo.

Ventor disse...

Olá, Brandeiros!
Não me preocupa nada a questão de veranda ou branda. Como tu dizes, a nossa gente fala assim e assim fica! Branda é como eu lhe chamo! Quanto à telenovela eu nem digo nada a não ser que aqueles que se dizem a guarda avançada deste país, naquilo que diz respeito à "cultura mesmo de pichebeque", deixa muito a desejar. Ainda se a novela fosse referência a algum passado próximo ou remoto, ainda que vá, mas faz referência a uma actualidae bem próxima e isso só me mostra o quanto há de anedotas neste país e que se julgam de supersumos. Uma tristeza!
Esta telenovela, para mim, não passa de um fiasco. Estou a observá-la, por curiosidade e pelo que já vi, acho que não vai dar para ver outra. Apenas a vejo com o intuito de conhecer bem os autores da cultura da sarjeta!
Essa dos lobos, então, os tais pilha-galinhas, é de bradar aos céus. Eu sei que eles, ainda há poucos anos lhe matvam os animais nas barbas, (cavalos, por ex:) mas ir ao galinheiro! Só me faz rir.
Um abraço,

Eira-Velha disse...

Ao amigo anónimo:
- A citação de Torga não se refere aos brandeiros, como bem se pode constatar no texto para o qual remtete a hiperligação correspondente, mas não hesitei em aplicá-la ali porque cai no contexto como uma luva, digo eu...
- A "brandura" do clima de montanha, no verão, é uma evidência, ou não?
- A definição apresentada não é minha, é do dicionário Priberam, eu limitei-me a dizer que é pouco, ou seja, é extremamente redutora...
- Beranda??? Se ainda fosse baranda...
Obrigado pela visita, pelo comentário e pelas questões levantadas. Podemos continuar a discutir o assunto mas não costumo responder a comentários. Para dialogar tenho um endereço de email disponível.

Brito Ribeiro disse...

Branda ou Veranda, que importa?
São marcos culturais genuinos do nosso povo do viver dos nossos antepassados, ao contrário dessas telenovelas de pacote, que nem sabem distinguir um lobo de uma raposa.
Abraço
BR

Unknown disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Unknown disse...

É sempre com imenso interesse e prazer que leio este blog e desta vez não consigo resistir a tecer um comentário sobre a ignorancia de alguns pseudo intelectuais que povoam a capital. Que a Srª da Peneda se tenha mudado da Freguesia da Gavieira no Concelho de Arcos de Valdevez para o Gerês, como tenho lido ultimamente em certos orgãos de comunicação, aínda vá que não vá, mas os lobos pilharem galinhas, essa é que não lembra a ninguem a não ser a alguem da capital que confunde a ovelha com o cão como na velha anedota alentejana.
Cumprimentos.
José Táboas