Sr. Inspector:
Em mais de trinta anos de serviço na Guarda Nacional Republicana nunca vi uma crítica tão veemente, humilhante e tão desadequada à acção das polícias como esta que V. Ex.ª desferiu na entrevista concedida ao Expresso, especialmente vinda de "dentro".
Conheço as fraquezas da organização em que estou inserido mas também reconheço tudo aquilo que V. Ex.ª omitiu e que é o que nos dá força para prosseguir: o tributo dado diariamente por milhares de agentes em prol de uma causa, amplamente reconhecido e divulgado nos órgãos de comunicação social.
Há alguns anos, Senhor Inspector, ocorreu um envenenamento de animais na via pública na zona da Lourinhã e um canal de televisão efectuou um reportagem naquela área onde entrevistou diversas pessoas anónimas, entre elas um miúdo de uns 9 ou 10 anos, a quem perguntarem o que faria se soubesse quem tinha praticado aquela barbaridade ao que o petiz respondeu: -Se soubesse quem foi informava a Guarda.
A atitude do menino revela confiança e não medo. Medo dos polícias tínhamos nós, nos anos 50 e 60 do século passado. Hoje não é assim e V. Exª sabe-o muito bem.
Então porquê generalizar?
V. Ex.ª tem responsabilidades, dirige o mais importante órgão de controlo (ex)terno da acção das polícias e não ignora a importância do papel desempenhado por aqueles que designou de "cowboys" no combate à criminalidade. Não pode ignorar que o crime organizado não se combate com rosas, nem que o problema da Guarda não é ser uma força militar, nem o facto de chamar "adversários" a quem está à margem da lei. Basta atentarmos no simples facto de eu estar a falar em combate, ou no nome de uma secção da Polícia Judiciária (Combate ao Banditismo) para percebermos que determinada linguagem belicista nada tem de errado mas se adequa àquilo que queremos exprimir.
Sinto-me ofendido, Senhor Inspector. Ofendido e humilhado. E não pense que é um qualquer sentimento corporativista. A minha opinião e visão crítica da Instituição tem sido reafirmada ao longo de dezenas de anos do serviço mais diverso, desde mero executante, nas ruas e nos campos, de pistola e bastão à cinta, até cargos de chefia e de controlo interno, de caneta em riste para "disparar" naqueles que ultrapassam os limites da legalidade... como pode ver
aqui se se dignar dar uma espreitadela.
Para quem em cerca de dois anos exerceu o cargo no mais completo obscurantismo acho que escolheu a forma mais errada de dar visibilidade à sua existência.
Boaventura Afonso Eira-Velha
P.S. Esta carta foi enviada por correio electrónico ao destinatário em 25 de Novembro de 2007. Poderei ser processado disciplinarmente por ousar dirigir-me a SEXA e manifestar-lhe a minha indignação mas não podia ficar indiferente perante tanta falta de respeito às Instituições e às pessoas.
O Senhor Inspector Geral há-de perceber que ele passará e as Instituições prevalecerão. Já assim foi e continuará a ser.